25% dos solos do planeta estão degradados, aponta avaliação inédita da Fao; desgaste afetará produção mundial de alimentos.
– A degradação generalizada
e o aprofundamento
da escassez dos
recursos do solo e da água colocaram em risco vários sistemas essenciais de
produção alimentar no
mundo, aponta um novo relatório da FAO, publicado hoje. O relatório fornece,
pela primeira vez, uma avaliação global do estado dos recursos dos solos do
planeta: 25% estão degradados. Segundo o documento, a degradação e a escassez dos
solos e da água impõem um novo desafio à tarefa de alimentar uma população
mundial que deve chegar a 9 bilhões de pessoas em 2050.
Ainda segundo o
estudo, 8% dos solos estão moderadamente degradados, 36% estão estáveis ou
levemente degradados e 10% estão classificados como "em recuperação".
O resto da superfície terrestre do planeta está descoberta (cerca de 18%) ou
coberta por massas de água interiores (cerca de 2%). Os dados incluem todos os
tipos de terras. A definição de degradação da FAO vai além do solo e degradação
da água. Ela abrange outros aspectos dos ecossistemas afetados, como a perda de
biodiversidade.
Grandes extensões de
terra em todos os continentes são alvos, com uma incidência particularmente
alta ao longo da costa oeste das Américas, na região mediterrânea do sul da
Europa e Norte da África, no Sahel, no chamado Chifre da África (no nordeste do
continente africano) e em várias partes da Ásia. A maior ameaça é a perda de
qualidade do solo, seguido da perda de biodiversidade e do esgotamento dos
recursos hídricos.
Atualmente, cerca de
1,6 bilhão de hectares dos melhores e mais produtivos solos do mundo são
utilizados para o cultivo. Partes destas áreas estão sendo degradadas devido às
práticas agrícolas que causam erosão hídrica e eólica, perda de matéria
orgânica, compactação do solo superficial, salinização e poluição do solo e
perda de nutrientes.
Distribuição da
degradação do solo no mundo: gráfico
Alguns sistemas
"enfrentam o risco de um colapso progressivo da sua capacidade produtiva
devido a uma combinação entre a excessiva pressão demográfica e a prática
insustentável da agricultura", diz o relatório.
Nenhuma região está
imune: podem ser encontrados sistemas sob risco em todo o mundo, desde as
terras altas dos Andes até às estepes da Ásia Central, passando pela bacia do
rio Murray-Darling na Austrália e no interior dos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, o
relatório sugere que, uma vez que as limitações dos recursos naturais são cada
vez maiores, a competição por terra e água será universal. Haverá competição
para uso urbano e industrial, bem como no setor agrícola, entre pecuária,
culturas básicas, culturas não-alimentares e produção de biocombustíveis.
Além disso, prevê-se
que as mudanças climáticas irão alterar os padrões de temperatura, precipitação
e das correntes dos rios, dos quais os sistemas mundiais de produção
alimentares dependem.
O texto observa que o
desafio de fornecer alimentos suficientes para um planeta com registros
crescentes de fome crônica nunca foi tão grande – especialmente nos países em
desenvolvimento onde solos de qualidade, nutrientes e água são menos
abundantes.
"O relatório
SOLAW destaca que o impacto coletivo das pressões e as consequentes
transformações agrícolas colocam alguns sistemas de produção em risco de
colapso tanto do ponto de vista da sua integridade ambiental como da própria
capacidade produtiva. Os sistemas podem simplesmente não ser capazes de
responder à demanda da população mundial até 2050. As consequências, em um
contexto de fome e pobreza, são inaceitáveis. A decisão de corrigir isso deve
ser tomada agora ", disse o diretor-geral da FAO, Jacques Diouf.
Sinais de alerta
Entre 1961 e 2009, as
terras cultiváveis no mundo cresceram 12%, enquanto a produção agrícola
aumentou 150%, graças a um crescimento significativo da produtividade das
principais culturas.
Mas um dos
"sinais de alerta" apontado pelo relatório SOLAW é que as taxas de
crescimento na produção agrícola foram diminuindo em muitas áreas e hoje são
apenas metade do que eram no auge da Revolução Verde.
O documento retrata um
mundo alvo de um crescente desequilíbrio entre a disponibilidade e a procura
por terras e água em nível local e nacional. E adverte que o número de áreas
que atingiram o limite da sua capacidade de produção aumenta rapidamente.
Escassez de água e poluição na nascente
O SOLAW traz ainda
detalhes sobre o aumento da escassez de água. A salinização e a poluição das
águas subterrâneas aumentaram, assim como a degradação das massas de água e dos
ecossistemas relacionados. Grandes massas de água interiores estão sob a
pressão de uma combinação de fluxos reduzidos e uma maior sobrecarga de
nutrientes – a acumulação excessiva de nitrogênio e fósforo, por exemplo.
Muitos rios não desaguam e os pantanais estão desaparecendo.
Nas principais áreas
de produção de cereais do mundo, a extração intensiva de águas subterrâneas
está secando os reservatórios de água e prejudicando o acesso das comunidades
rurais às águas subterrâneas.
O relatório da FAO
adverte que "a dependência de muitos sistemas de produção alimentar em
relação às águas subterrâneas, o declínio dos níveis freáticos e a extração
contínua de água subterrânea não renovável representam um risco crescente para
a produção alimentar local e global".
Distribuição da escassez
de água no mundo: mapa
A armadilha da pobreza
"Em todo o mundo,
os mais pobres têm menos acesso ao solo e água e são apanhados na armadilha da
pobreza das pequenas propriedades com solos de má qualidade e alta
vulnerabilidade à sua degradação e à incerteza climática", observa o
relatório.
Cerca de 40% dos solos
degradados no mundo encontram-se em áreas com elevadas taxas de pobreza. Além
disso, num sinal de que a degradação é um risco em todos os níveis de
rendimento, 30% dos solos degradados do mundo encontram-se em áreas com níveis
moderados de pobreza, enquanto 20% estão em áreas com baixos índices.
Perspetivas para o futuro
A FAO estima que em
2050 o crescimento da população e da renda vai exigir um aumento de 70% da
produção global de alimentos. Isso equivale a mais 1 milhão de toneladas de
cereais e 200 milhões de toneladas de produtos de origem animal produzidos
anualmente.
O relatório afirma que
"para melhorar a nutrição e diminuir a insegurança alimentar e a
desnutrição, a produção agrícola terá de aumentar mais rapidamente que o
crescimento populacional. Os padrões de consumo também têm de ser
ajustados".
4/5 dos ganhos de
produção terão de ocorrer na maior parte das terras agrícolas existentes por
meio da intensificação sustentável, que utiliza os recursos do solo e da água
sem causar danos.
Recomendações
De acordo com o
relatório, melhorar a eficiência do uso da água pela agricultura será
fundamental. A maioria dos sistemas de irrigação funciona abaixo de sua
capacidade. A combinação de uma melhor gestão da irrigação, o investimento no
conhecimento local e na tecnologia moderna e o desenvolvimento da capacitação
podem aumentar a eficiência do uso da água.
Além disso, práticas
agrícolas inovadoras, como a agricultura de conservação, sistemas
agro-florestais, integração da produção vegetal e da pecuária e sistemas
integrados de irrigação e aquicultura prometem expandir a produção de forma
eficiente para garantir a segurança alimentar e combater a pobreza,
restringindo ao mesmo tempo os impactos sobre os ecossistemas.
Estima-se que entre
2007 e 2050 o investimento na gestão dos sistemas de irrigação dos países em desenvolvimento
seja de quase U$ 1 trilhão. A proteção e recuperação dos solos, somado ao
controle de inundações, exigirão cerca de U$ 160 milhões de investimentos no
mesmo período.
A FAO recomenda
atenção para as técnicas que tornam a produção sustentável e eficiente,
modernizam as instituições e as políticas nacionais. Ações coordenadas de
instituições bem preparadas poderão responder os desafios da gestão dos solos e
da água.
O SOLAW traz inúmeros
exemplos de atividades bem-sucedidas em várias partes do mundo. Há muitas
opções de experiências que podem ser reproduzidas em outros lugares. Dada a
crescente competição por recursos naturais, as partes interessadas precisam
avaliar os compromissos entre a variedade de bens e serviços do ecossistema.
Este conhecimento pode servir para mobilizar a vontade política, a definição de
prioridades e as ações adequadas dos governos.
Estudo publicado em 28 de novembro de 2011.
Abraão Michelon
Empresário, Bacharel em Teologia, Casado com Michelle Oliveira de Sousa e pai de Isaac e Sarah.